A vida pra quem tá no sistema é foda, mas para quem tá caindo fora do sistema, ela é um pouco mais aperreada. Que nada.
O sol daquela sexta-feira já evidenciara o fascismo cotidiano do cidadão médio da cidade de Fortaleza que decepa a vida com o pretexto de acabar com a violência. Atravessando a avenida sem encontrar sombras, abestei: onde estão as árvores?
O discurso drogadito capitalista nos faz caminhar nas cidades com medo, entre toneladas de aço, dióxido de carbono, buzinas, discursos de ódio e deselegância. Se o medo dá origem ao mal, então é certo que vivemos a era da maldade. E como produzir tranquilidade? Em pleno curso da sexta extinção em massa conhecida pelo homem, existem rotas de re-existências poéticas?
“De manhã cedo tem o café amargoso e a gente tá aqui pra trabalhar às 5”, cabuetou o encarregado de caixa de um grande supermercado .
“Quando saio pra farrear não me falta dinheiro, vou até a noite acabar o grilo”, sorrindo e abanando a fumaça do cigarro barato.
Com tantas notícias opressivas do estado, movido por interesses corporativos, como encontrar alegria? Há espaço para a diferença?
Na loja de conveniência, enquanto o sol se punha, uma menina pedia macarrão instantâneo e sua família de rua dividia a comida com transeuntes bêbados. Do lado de fora, hiluzes apontavam nervosas no asfalto e as pernas tremiam com alegria. Era hora de caminhar para a Feira Punk na pracinha da Aerolândia.
“Eu tava indo pra casa e vi os punks passando. Aproveitei então a oportunidade pra chegar junto. Já havia ido outra vez a uma feira dessas, lá na Montenegro, na Vila Peri. Vi que era legal, uma vivência da cidade, uma vivência livre, onde as pessoas vem, se encontram, escutam uma música legal e compartilham experiências punks”, dizia o punk que negava o rótulo.
Ao chegar na praça, que faz fronteira com a principal rodovia brasileira, o clima era o de uma pracinha do interior. As crianças de diversas idades e cores corriam, enquanto pais e mães conversavam, alguns já com seus churrasquinhos e drinks. Mas aquela noite preparava algo diferente.
A fileira de bicicletas e o visual dos punks pareciam destoar dos habitantes comuns daquele espaço, que aos poucos se aproximaram e interagiram com as atrações também protagonizadas pela galera do circu pirata – anarquistas anônimos que se utilizam do circo para apresentar visões de mundo para todos os públicos, principalmente as crianças.
As cadeiras lado a lado, de frente para o projetor, aguardavam a exibição de filmes do Chaplin em um evento, promovido sob o argumento da autogestão.
Malabares de fogo, trombetas e tambores se mesclavam às cabeças-poéticas-infláveis-gigantes-contorcidas, enquanto crianças e adultos se divertiam com o espetáculo circense. A mensagem poética lançada naquela noite deixaria um rastro de diferença no cotidiano daquele espaço público de convivência.
Com encontros e conversas interessantes, essa noite de feira punk na aerolândia deixa a certeza de que a surpresa ainda pode causar afeição por nossa cidade.
quem procura
na faixa
encontra poesia
Massa o relato …